quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Que hinferno!


Por Ciro Sanches Zibordi

Calma, pessoal! O erro ortográfico acima foi proposital. Mas, como a hifenização vigente tornou-se “infernal”, só posso chamá-la mesmo de hinfernização.

Não foi por acaso que o intelectual Fernando Henrique — com todo o respeito ao presidente Lula — não quis assinar o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa entre os países lusófonos (Portugal, Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Timor Leste e Macau).

Considero o atual uso do hífen “infernal” porque o aludido Acordo tornou essa matéria ainda mais controvertida em muitos aspectos. Assisti a uma palestra com a professora Lurdes Theresinha Rissi, na sessão de abertura do ano sócio-cultural da Academia Evangélica de Letras do Brasil (AELB), há algum tempo, e ela — que é uma especialista no assunto — afirmou que o Acordo veio mesmo para complicar.

Para começar, não se usa o hífen quando o prefixo termina em vogal diferente da vogal que inicia o segundo elemento. Fácil, não? Veja: aeroespacial, anteontem, antiespírito, autoestrada, infraestrutura, plurianual, semiaberto, coautor, coedição... Ah, no caso do prefixo “co” há mais uma exceção: ele aglutina-se com o segundo elemento, mesmo quando este se inicia por “o”. Observe: coobrigar, coordenar, cooperar, coocupante.

Também não se usa o hífen quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por consoante diferente de “r” ou “s”. Eis alguns exemplos: anteprojeto, antipedagógico, autopeça, coprodução, pseudoprofessor... Aliás, não sei se você sabe, há muitos crentes seguindo a pseudopastores, considerando-os semideuses. Talvez isso se dê pelo fato de muitos deles serem ultramodernos — ou ultramundanos? Ah, já ia me esquecendo... Com o prefixo “vice” usa-se sempre o hífen: vice-rei, vice-almirante, vice-presidente, etc.

Não se usa o hífen, ainda, quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por “r” ou “s”. Nesses casos ocorre uma estranha duplicação das letras: antirracismo, antirreligioso, antissocial, biorritmo, minissaia, microssistema, ultrassom, ultrarresistente, neossimbolista... Bem, para muitos, a hifenização (ou hinfernização?) é um contrassenso...

Quando se usa o hífen? Primeiro, ele deve ser empregado sempre depois dos prefixos antecedidos de “h”. Entendeu? Por exemplo, anti-higiênico, anti-histórico, co-herdeiro, macro-história, super-homem, ultra-humano... Mas, quando parece estar tudo bem, surge uma desumana exceção: subumano. Por que o “h” e o hífen não valem para esta palavra? Alguém pode explicar? Deixa pra lá. Vamos adiante...

Segundo, quando o prefixo termina por vogal, usa-se o hífen se o segundo elemento começar pela mesma vogal. Por exemplo: anti-ibérico, anti-imperialista, anti-inflamatório, contra-almirante, contra-ataque, semi-internato, auto-observação, micro-ondas, micro-ônibus... Quê? Até os “oos” são hifenizados? Isso mesmo. Como vimos, eles só não recebem hífen nos casos em que ocorre o prefixo “co”.

Terceiro, emprega-se o hífen quando o prefixo termina por consoante, se o segundo elemento começar pela mesma consoante: hiper-requintado, inter-racial, super-romântico, super-resistente... “Que é isso? E a duplicação da letra r, mencionada acima?” — alguém poderá perguntar. Nesses casos, a duplicação da letra não se aplica, e vejo aqui sensatez, posto que, não havendo uso de hífen, a pronúncia das palavras seria diferente (faça o teste lendo-as sem o hífen). Mas, nos demais casos, o hífen permanece ausente: hipermercado, superinteressante, superproteção...

Como é preciso ter uma hiperpaciência e fazer um esforço sobre-humano para examinar cada um desses detalhes, vou parando por aqui. Mas ainda não terminei! Creio que precisarei de, pelo menos, mais dois artigos para discorrer sobre a hifenização, que, sem dúvidas, é a parte mais complicada do Acordo Ortográfico.

Bem, se eu fosse um super-revolucionário, me revoltaria contra o Acordo em análise. Mas, como estou superotimista com o progresso das minhas pesquisas, prefiro continuar me adaptando, a cada dia (e compartilhando o que tenho aprendido), a fim de que não me torne, no futuro, um semianalfabeto.

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