Moisés Olímpio Ferreira
Já no alto da torre, as gordas raposas, sempre imaginando como manter sua posição privilegiada,
criavam e recriavam estratégias das mais esdrúxulas para manter o seu domínio que fora
estabelecido pela violência, pela injustiça, pelo roubo e, sobretudo, pela mentira. Acostumadas a
constituir riqueza transformando o trabalho dos burros em ouro para si, fortificaram-se ainda mais:
fizeram alianças com serpentes, escorpiões, aranhas peçonhentas, sapos, ratos, bodes e com
outros animais com os quais há muito se alinhavam pelos traços comuns da ambição e dos
procedimentos.
Ultimamente, cheios de sadismo, provocaram alucinações com a escada:
- Vocês a vêem? Ela está aí, posta, esticada, perto de vocês. Não estão vendo? Vocês podem
subir por ela! Não tenham medo, subam até aqui! Experimentem a conquista, o poder, a
multiplicação, a honra de suas cabeças de burro!.
Já privados de razão e de liberdade (uns pelo prazer mórbido, outros porque tinham natureza
servil, outros pela reinação dos encontros, outros pelo sonho de uma cabana, outros por estarem
persuadidos de que um dia seriam raposas, outros porque não sabiam que eram escravos),
ouviam aquele discurso com lágrimas nos olhos. Levantavam e abaixavam as patas em sinal de
veneração.
- Temos muito para vos dar. Tenham coragem! Vocês serão transformados a partir de hoje, se
subirem aqui! Permitam que o poder invada seus corações asinais, para que vocês possam viver
tudo o que já temos vivido!.
O alvoroço não foi de pequena monta. O momento do estabelecimento do reino tão aguardado e
pelo qual tanto trabalhavam teria chegado? Sim, certamente, pensavam.
- Seremos reis! Seremos reis! Seremos reis! Seremos reis! Neste ano nos apossaremos da
floresta! Uníssonos, bradavam.
Certos de que lhes bastavam apenas subir a escada, não se agüentavam em seus lugares. Os
espíritos estavam aguçados; os nervos, à flor da pele; os pêlos, ouriçados; as pupilas,
esbugalhadas...
-Lembram-se de que o leão se tornou rei? Todos poderão ser como ele!.
Não havia mais espaço para tanta emoção. Beijavam-se, agarravam suas crias, machos e
fêmeas apertavam-se sonhosos. Com os olhos molhados, encostavam as cabeças uns nos
outros em sinal de êxtase.
- Lembram-se de que nós estávamos aí e de que conseguimos subir? A partir de hoje todos
serão como nós! Vocês verão o mundo de cabeça para baixo!
Como se mexiam desesperadamente para subir os degraus, de muito longe, o tilintar das patas
podia ser ouvido com sonoridade definida.
- Isso mesmo, continuem... Venham... Sejam audaciosos... Aqui em cima sobejará provisão para
vocês e para as suas famílias. Venham viver em lugares altos!
Com os olhos fechados e com o corpo em transe, subiam a escada de ouro imaginária. Nesse
entusiasmo, agora irreprimível e insano, saltavam degraus para chegar mais rápido, puxavam
alguns para passar à frente, patejavam a cabeça de outros, rasteiravam o próprio amigo,
pescoceavam veementemente... Instalou-se o gosto desmedido pela fantasia.
No alto, as raposas gargalhavam, porque os burros, em extrema agitação, despercebidamente se
sujavam em seus excrementos ... Sarcasticamente, deram um nome ao evento: Ano do Esterco!
Fonte : www.moisesolim.blogspot.com
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